segunda-feira, 19 de abril de 2010

DIREITO DO TRABALHO

PROJETO DE LEI DO SENADO DE 2010

Dispõe sobre a contratação de serviços de terceiros e dá outras providências.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1° Os contratos de prestação de serviços terceirizados observarão as disposições desta Lei, com aplicação subsidiária das normas do Código Civil Brasileiro, instituído pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

Parágrafo único. Consideram-se serviços terceirizados aqueles executados mediante contrato de terceirização, para pessoa física ou jurídica de direito privado, inclusive empresas públicas e sociedades de economia mista, denominada contratante, por pessoa jurídica, denominada contratada, especializada na prestação dos serviços objeto da contratação.

Art. 2° O contrato de terceirização, que poderá abranger qualquer atividade da contratante, deverá ser escrito e conter, além dos requisitos exigidos pela lei civil, o seguinte:

I – especificação dos serviços;

II – local da prestação dos serviços;

III – prazo de vigência, determinado ou indeterminado, permitidas sucessivas renovações; e

IV – periodicidade e forma de verificação pela contratante do cumprimento pela contratada das obrigações trabalhistas relativas aos empregados que efetivamente participarem da execução dos serviços terceirizados.

Parágrafo único. Será nula de pleno direito cláusula contratual que proíba ou imponha a contratação de empregados da contratada pela contratante.

Art. 3° É requisito obrigatório para a celebração do contrato de serviços terceirizados a apresentação, pela contratada, dos seguintes documentos, além de outros exigidos pela contratante:

I – registro como pessoa jurídica, na forma da lei, se for o caso;

II – inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica – CNPJ do Ministério da Fazenda;

III – alvará de localização e funcionamento;

IV – comprovante de entrega da última Relação Anual de Informações Sociais – RAIS devida;V – Certidão Negativa de Débito – CND ou Certidão Positiva de Débitos com efeito Negativo – CPD-EN, da Previdência Social; e

VI – Certificado de Regularidade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS.

Art. 4º É de natureza empregatícia a relação entre a contratada e seus empregados.Parágrafo único. Não se configura o vínculo empregatício entre a contratante e os empregados ou sócios da contratada ou de seu subcontratado, exceto se, na prestação de serviços, for judicialmente reconhecida relação de emprego, com a contratante, nos termos do caput do art. 3° da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1° de maio de 1943.

Art. 5º A contratante será responsável pelas condições do ambiente de trabalho, quando o serviço for realizado em suas dependências ou em local sob sua responsabilidade.Parágrafo único. Cabe à contratada a responsabilidade de velar pelo cumprimento das normas de segurança e saúde no trabalho e de exigi-lo de seus empregados.

Art. 6° Quando o serviço for executado nas dependências da contratante, esta deverá assegurar aos empregados da contratada o acesso à 2estrutura disponível a seus empregados, no que se refere à alimentação, atendimento ambulatorial e condições sanitárias.

Art. 7º A contratante será subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas dos empregados da contratada que participarem da prestação de serviços, durante o período e nos limites da execução do serviço contratado, inclusive se houver subcontratação de serviços, nos termos do art. 8°.§ 1º A responsabilidade subsidiária será convertida em solidária, no caso de falência da contratada e de inobservância das disposições dos arts. 2° e 3° desta Lei.§ 2° A imputação de responsabilidade solidária ou subsidiária implica apenas o pagamento de direitos e o cumprimento de obrigações trabalhistas, não gerando vínculo de emprego entre a contratante e o empregado da contratada.

Art. 8° A contratada poderá subcontratar empresa ou profissional autônomo para a realização de parte dos serviços, desde que previsto no contrato firmado com a contratante.

§ 1° A subcontratação será regida pelas disposições desta Lei, cabendo à contratada assumir todos direitos e obrigações de contratante.

§ 2° A subcontratação de profissional autônomo só é permitida quando se tratar de serviços especializados.

Art. 9º Aos empregados da contratada serão assegurados os direitos instituídos em sentença normativa decorrente de dissídio coletivo entre as categorias econômicas e profissionais respectivas, bem como em acordo ou convenção coletiva de trabalho celebrados pelo sindicato representativo da respectiva categoria profissional com a empresa contratada ou com o sindicato representativo da respectiva categoria econômica.

Art. 10. O recolhimento das contribuições previdenciárias no regime de terceirização regulado por esta Lei observará o disposto no art. 31 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.

Art. 11. O descumprimento do disposto nesta Lei sujeita a empresa infratora ao pagamento de multa administrativa de R$ 200,00 (duzentos reais) mr2010-006753por empregado prejudicado, salvo se já houver previsão legal de multa específica para a infração verificada.

Parágrafo único. A fiscalização, a autuação e o processo de imposição de multas reger-se-ão pelo Título VII da CLT.

Art. 12. Esta Lei entra em vigor no prazo de cento e oitenta dias da data de sua publicação.


JUSTIFICATIVA


A falta de uma disciplina legal para a contratação de serviços de terceiros tem gerado enormes problemas para os trabalhadores, para as empresas e para a economia do Brasil. Um dos problemas mais sérios é o que afeta os trabalhadores que participam dessa contratação. Apesar de a terceirização ser um processo de divisão do trabalho baseado na parceria, é muito frequente o descaso em relação aos direitos dos que participam desse processo.

Embora inexistam estatísticas a respeito, são inúmeros os exemplos de empregados das empresas contratadas que são submetidos a condições precárias de trabalho. Para muitos analistas, a terceirização chega a ser sinônimo de precarização, tendo em vista que as empresas contratantes e as contratadas não encontram consenso quanto às responsabilidades de cada uma na proteção daqueles empregados.

A Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) – única disposição normativa disciplinadora da matéria – estabeleceu que a empresa contratante (também chamada de tomadora dos serviços terceirizados) tem responsabilidade subsidiária em relação aos direitos dos empregados da empresa contratada (também chamada de prestadora de serviços). Isso significa que, se a contratada deixar de cumprir as obrigações trabalhistas e previdenciárias em relação aos seus empregados, a contratante terá de assumir essa responsabilidade.

Em boa hora o TST estabeleceu essa regra, que, entretanto, foi aprovada em 1995. De lá para cá muita coisa mudou nos processos de produção 4e comercialização de bens e serviços. Além do mais, verificou-se haver empresas de todos os tipos no terreno da terceirização.

Há uma parcela expressiva de empresas contratantes que agem realmente como parceiras, procuram contratar empresas idôneas, seguem mês a mês o cumprimento das obrigações trabalhistas e previdenciárias das contratadas e, com isso, exercem uma saudável pressão para que se cumpra a legislação trabalhista vigente.

Existe, porém, outra parcela de empresas, também expressiva, que ainda não compreendeu a necessidade da prática da parceria, não assume as suas responsabilidades e acaba permitindo a precarização das relações de trabalho. A responsabilidade subsidiária pode, então, não ser suficiente para a garantia dos direitos dos trabalhadores terceirizados.

Este projeto introduz uma inovação importante nesse campo. Por meio de um sistema muito simples de aferição, busca-se estabelecer a responsabilidade subsidiária para as contratantes que agem como parceiras autênticas e, por isso, cuidam do monitoramento das proteções dos empregados das contratadas, e, em contrapartida, a responsabilidade solidária para as que optam por outro caminho.

Como se sabe, na responsabilidade solidária, o empregado prejudicado pode acionar diretamente tanto a empresa a que pertence (contratada) como a que contratou os serviços. Por si só, essa diferenciação induzirá a grande maioria das empresas a optar pela real parceria, monitorando, passo a passo, a situação dos empregados das empresas contratadas. Essa é a medida mais importante a ser garantida pela nova lei.

A proposição também atenta para os processos produtivos da atualidade, que se baseiam na articulação de empresas especializadas. Nenhuma empresa pode fazer de tudo. Há mais eficiência quando empresas de diferentes especializações formam redes de produção nas quais cada uma faz a sua parte. É uma divisão do trabalho que se baseia em verdadeiras constelações de empresas que maximizam as vantagens comparativas de cada uma.

A terceirização baseia-se na parceria e busca a especialização, a mr2010-006755qualidade, a pontualidade, a velocidade e o custo. Quando se analisa o entrosamento dos parceiros, verifica-se a existência de verdadeiras constelações de relações do trabalho. Mesclam-se nesse processo empregados por tempo indeterminado, por tempo determinado, por tempo parcial e outros, das contratantes e das contratadas. Todos precisam estar protegidos pela legislação.

Do lado das empresas contratantes, busca-se terceirizar o que as contratadas fazem melhor, em menos tempo, com mais eficiência e mediante custos compensadores. Pela Súmula 331 do TST, entretanto, nem toda atividade pode ser terceirizada. Apenas as atividades meio são passiveis de terceirização. Esse é um grande problema para as empresas, o que, por sua vez, gera uma enorme insegurança jurídica, que buscamos eliminar com este projeto.

Os próprios juízes revelam ter grandes dificuldades para definir precisamente o que seja atividade meio e atividade fim nas empresas que operam dentro de redes de produção. Em muitos casos, as decisões se baseiam na subjetividade, o que explica as enormes diferenças que existem entre as sentenças dos vários tribunais. Ademais, essa distinção deixou de ser importante, na medida em que as empresas precisam contratar o que as outras fazem melhor, sob todos os pontos de vista.

Por isso, este projeto admite a contratação de qualquer atividade, desde que se respeite o princípio da proteção dos trabalhadores envolvidos no processo. Aliás, esta é a necessidade fundamental. A distinção referida nada tem a ver com a proteção conferida aos trabalhadores. A lei precisa ter mecanismos eficientes para garantir as proteções trabalhistas e previdenciárias a todos. Pouco importa em que tipo de atividade os trabalhadores atuem. O essencial é que estejam protegidos.

A lei, em si, não pode criar o espírito de parceria entre as partes contratantes e contratadas. Mas pode induzi-las a isso. Com a criação da responsabilidade solidária, poucas empresas – se é que existirá alguma – quererão ficar fora de um sistema de parceria por meio do qual se garantem proteções para todos os participantes do processo. É a lei induzindo à necessária parceria.

Esse é o modelo que melhor se adapta a um mundo no qual o trabalho se segmenta cada vez mais. Aliás, as novas tecnologias e os novos 6métodos de produção permitem que as tarefas sejam realizadas em todas as partes do mundo. Isso significa que os constrangimentos à terceirização no mercado doméstico estimulam a terceirização no mercado externo. Com isso, o país de origem transfere os empregos para o país de destino. É tudo o que o Brasil não quer.

No Brasil, a terceirização é um fato irreversível. Faz parte da nova divisão do trabalho e constitui peça essencial na formação de redes de produção. Nos dias atuais, não são mais empresas que competem entre si. A verdadeira competição se dá entre as redes de produção, e isso é crucial para a manutenção das empresas e dos empregos. A eficiência das redes é que coloca as empresas no lado perdedor ou ganhador, na concorrência interna e externa.

Façamos, ainda, mais um registro teórico. Muito se tem confundido o conceito de terceirização com o de intermediação de mão-de-obra, que são institutos distintos. Essa interpretação criou resistência e incompreensão no campo da terceirização.

Uma das formas mais claras de intermediação de mão-de-obra é o trabalho temporário, regulado pela Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974. No contrato de trabalho temporário, a empresa fornecedora de mão-de-obra contrata e remunera o empregado, mas transfere à empresa tomadora ou cliente, durante a sua vigência, o poder de comando. O empregado temporário insere-se, transitoriamente, nas atividades normais da tomadora, seja pela substituição de pessoal regular e permanente desta, seja reforçando o seu quadro de pessoal na hipótese de acréscimo extraordinário de serviço, e, por isso, sujeita-se a regras especiais.

Por seu turno, a terceirização difere inteiramente da intermediação ou cessão de mão-de-obra. Trata-se de uma forma própria de gestão e de organização do processo produtivo de quem contrata o serviço de terceiros, os quais o realizam com organização própria, autonomia técnica e jurídica. Além disso, a terceirização baseia-se na especialização da empresa terceirizada em determinada atividade ou serviço, não havendo colocação de seus empregados à disposição da contratante.

O projeto de lei define e contempla diversas garantias. O parágrafo único do art. 1° define claramente o que são os contratos de prestação de mr2010-006757serviços terceirizados, e os arts. 2° e 3° estabelecem as regras para a contratação.

A relação de emprego dos empregados envolvidos na terceirização permanece regida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), conforme consta do art. 4° deste projeto. Nenhuma norma consolidada está sendo alterada. Se, na prestação de serviços, ficar configurada, judicialmente, a existência de vínculo empregatício, nos termos do art. 3° da CLT, a empresa contratante assumirá as responsabilidades disso decorrentes. É o que se pretende com a redação dada ao parágrafo único do art. 4°.

O projeto estabelece que a responsabilidade da contratante é subsidiária em relação à contratada. Para tanto, a contratante terá de ser cuidadosa na hora da contratação e fazer um monitoramento permanente da empresa contratada, respeitando, assim, os termos do contrato firmado entre ambas. Se isso não for feito, a responsabilidade da empresa contratante transforma-se em solidária, como estabelece o art. 7º.

Com isso, o projeto definiu um sistema de penalização crescente que estimula a empresa contratante a selecionar contratadas idôneas e a monitorar a sua conduta em relação às suas obrigações trabalhistas durante toda a execução do contrato.

Querer atribuir a responsabilidade solidária para as contratantes em todas as circunstâncias é burocratizar o processo e inviabilizar a terceirização. Como se sabe, nesse tipo de responsabilidade, o reclamante escolhe quem acionar. Isso acaba com a divisão de riscos do processo de contratação de serviços.

Por outro lado, querer isentar a empresa contratante de responsabilidade subsidiária (ou solidária, conforme o caso) é promover uma terceirização predatória. Há que se buscar o meio termo, como está estabelecido no art. 7º deste projeto. Para as que cuidam do exame e da monitoria das empresas contratadas, no que se refere ao cumprimento do pagamento adequado dos trabalhadores e do recolhimento do FGTS e do INSS, a responsabilidade é subsidiária; para as que não adotam essas cautelas, passa a ser solidária.

O projeto de lei reconhece que, nas cadeias ou redes de produção, a 8contratação de serviços abrange todos os tipos de atividade que são realizados com mais eficiência por empresas que se especializam nessas atividades. A busca da especialização é a marca da produção moderna. Empresas de especializações diferentes entrelaçam-se por tempos curtos ou prolongados para produzir com mais qualidade e maior eficiência.

Além de prever o respeito rigoroso às leis trabalhistas e previdenciárias, o projeto vai além, ao prever outras proteções para os profissionais da empresa contratada. O art. 5° exige, por parte da contratante, a responsabilidade pelas condições do ambiente de trabalho e, por parte da contratada, a responsabilidade pelo cumprimento das normas de segurança e saúde do trabalho por seus empregados. Mais do que isso, a contratante terá de franquear o acesso às instalações utilizadas pelos seus empregados, no que se refere à alimentação, atendimento ambulatorial e condições sanitárias.

Com base na disciplina estabelecida por este projeto de lei, o Brasil terá uma legislação clara e adequada, pois os empregados das contratadas terão garantidas as proteções a que fazem jus e as contratantes terão garantida a segurança jurídica de que necessitam.

São estas as razões que me fazem submeter a presente proposição à análise dos nobres Parlamentares, para a qual peço apoio.

Sala das Sessões,

EDUARDO AZEREDO
Senador

Nenhum comentário:

Postar um comentário